segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O preço da ingerência

Recentemente ouvi de um professor de MBA uma tese interessante sobre os benefícios dados aos grandes executivos do país. Ele defendia que em alguns casos, o que aparenta ser um benefício ao profissional, na verdade é apenas uma maneira inteligente que o conselho encontra para utilizar da melhor maneira possível os seus ativos humanos. O exemplo que ele deu foi o do CEO da Companhia Vale do Rio Doce, Roger Agnelli. Segundo a tese do professor, disponibilizar um jato para o senhor Agnelli é muito mais do que dar conforto a uma pessoa que vem provando sua grande capacidade de gestão a cada dia que passa, é sim, garantir que o tempo desta pessoa seja bem utilizado, pois vale muito. Pessoas como ele têm muito mais valor descansadas, com boa aparência e bem preparadas para uma reunião internacional, do que nas filas dos aeroportos do país. Como acionista ultra-minoritário da Vale, posso afirmar que estou satisfeito com o jatinho do Sr. Agnelli.

Raciocínio similar parece não ocorrer em escalas bem menores do que a do exemplo citado. Quando penso no que ocorre no dia-a-dia de algumas empresas, vejo uma constante afronta aos princípios mais básicos de gestão dos recursos humanos. Coisa comum é a ingerência praticada por alguns dos líderes empresariais com os quais tive contato . Não quero nem explorar o lado humano (ou desumano) desta prática. Coisas como desmotivação, perda de oportunidades de desenvolvimento e trabalho em equipe, eu deixo para depois. Estou falando da má utilização dos ativos da empresa que esta prática acarreta, uma simples análise numérica. Imagine, só a título de exemplo, que um CEO de uma empresa recebesse 3 vezes o salário de um gerente de alto nível, e 5 vezes o de um gerente médio. Se este CEO gastasse algo em torno de 30% do seu tempo fazendo o trabalho da alta gerência e 20% o da média (e, acredite, tenho exemplos reais de que isto ocorre), quanto esta brincadeira custaria para a empresa? Vamos fazer o cálculo: metade do salário do CEO não valeria nada, pois ele passaria metade do tempo fazendo o trabalho dos outros. Do gerente de alto nível, 30% do salário seria jogado no lixo e do médio gerente, 20%. Se você fizer a conta, perceberá que o CEO em questão estaria fazendo valer apenas 0,36 do seu salário. Em outras palavras, estaria desperdiçando 64% do seu salário, deixando de fazer o seu trabalho e fazendo o trabalho dos outros.

Reforço que esta simples conta considera apenas, e de maneira extremamente simples, os efeitos financeiros atrelados à salários. Os impactos no desenvolvimento da equipe, e outros impactos economicos advindos dos assuntos importantes que o CEO e sua equipe deixam de tratar nem estão sendo considerados. Agora eu pergunto, se um executivo destes não consegue perceber o impacto de suas atitudes na gestão dos ativos mais importantes da empresa, que são as pessoas sob sua responsabilidade, imagine o que ele está fazendo com os outros ativos? Da empresa que este homem lidera, eu não compraria nem meia ação.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Como espantar um bom executivo

Se sua empresa tem bons executivos, pessoas promissoras mesmo, que podem atrapalhar o seu brilho eterno, aí vão algumas dicas para se livrar do problema:

- promova ele de mentira e se faça de bobo;

- gerencie a área por ele;

- receba um pedido de demissão de um funcionário dele, e peça para o funcionário não contar para ele;

- trate-o como criança de pré-escola, desenhando no papel como quer que as coisas sejam feitas;

- use de ironia para se livrar das situações complicadas, quando ele te coloca em xeque;

- controle a vida dele como se fosse um vagabundo que não gosta de trabalhar;

- obrigue-o a tirar férias quando ele pedir alguns dias de folga depois de ter trabalhado além do horário a vida toda, mesmo tendo um cargo de "confiança".

Se ainda assim ele continuar na sua empresa, fica a questão, será que ele é mesmo um bom executivo?

A exportação e os testes cardíacos

Exportar no Brasil dos dias de hoje é coisa para macho. Tem que ter sangue de barata e gostar de desafios. Imagine no meu caso, gerente de controle de materiais de uma empresa 100% exportação. É um teste cardíaco que coloca a esteira ergométrica no chinelo. Aliás, meu cardiologista já me dispensou, está pensando até em terceirizar alguns exames para a nossa empresa. Se o paciente agüentar uma semana de câmbio desfavorável, greves da receita federal e atrasos de navios por condições precárias dos portos, terá o seguinte diagnóstico : “Coração, excelente! Próximo passo, procurar um psiquiatra”.

É improvável que alguém ainda acredite na conversa de que o país está crescendo. Não está crescendo, está ocupando o espaço que tinha de sobra. Crescer é outra coisa. Crescer é sacrificar o presente para investir no futuro. Onde está este crescimento? Eu não vejo. Somente neste ano, mais de 50% dos navios que trazem matéria-prima para a nossa empresa atrasaram por problemas nos portos, congestionamentos e greves. No auge da última greve, todos os materiais que chegavam estavam caindo em canal amarelo por uma falha no software da receita federal. Coincidência ou não, mais um problema grave de infra-estrutura. Mais um teste cardíaco. E estamos falando somente da importação de matéria-prima.

Nas exportações a situação é ainda mais séria. Escutei de um economista conhecido no país que câmbio bom é aquele que deixa todo mundo insatisfeito. Não é o caso atual, onde quem exporta está beirando a falência e quem importa está mais feliz do que nunca. Com esta situação, nosso produto ficou aproximadamente 15% mais caro. Como vendemos em mercados onde o preço é condição básica de negociação (China, Rússia e outros), esperar algum lucro destas negociações é mais do que otimismo, é falta de noção de matemática básica.

Agora juntemos os fatos, situação cambial desfavorável e exigência de redução de preços cada vez maior por parte dos clientes. A única maneira de se manter no negócio de exportação é a redução dos custos operacionais. Como reduzir os custos operacionais em um país onde a infra-estrutura é precária, exigindo um nível de estoques alto para evitar rupturas no fornecimento? Como reduzir custos operacionais em um país onde as leis trabalhistas praticamente eliminam qualquer possibilidade de otimização e flexibilização da mão-de-obra? Como reduzir custos em geral com a carga tributária atual?

A conclusão disto tudo é que estamos presos pela falta de visão dos nossos governantes. Ninguém tem coragem de dizer ao povo que o salário mínimo vai ficar onde está, pensando no futuro. Falta seriedade para acabar com a roubalheira e com isto precisar de menos impostos para fazer o que precisa, pensando no futuro. Falta um monte de coisas e não sou eu quem vai ficar aqui listando. A China teve coragem de mudar, o Chile teve coragem de mudar, o leste europeu está tendo coragem de mudar. Nós não temos. Nosso povo não tem coragem. Nosso povo não abre mão de nada pelo futuro. Nossos governantes adoram. Nossos cardiologistas agradecem.

Sem Noção

Recentemente a empresa onde trabalho sofreu uma reestruturação e eu tive que fazer o desligamento da maior parte da minha equipe. Apesar de o processo ter sido justo e tranqüilo, é claro que não foi sem dor, para os que ficaram e, claro, para os que saíram. Só da minha área, em torno de quarenta pessoas foram desligadas. Da empresa como um todo duzentos e quarenta. Este fato ocorreu há mais de uma semana, e não consigo lembrar agora de nenhum colega fazendo piada sobre a situação, ou sequer com sorrisos duvidosos estampados na face durante o processo. Não acho que esta atitude seja algo fora do comum, ou sequer difícil de se encontrar em situações parecidas.

A situação não parece ser a mesma quando falamos do setor público. Ao invés de ter demitido duzentos e quarenta pessoas, o governo assistiu à morte de aproximadamente duzentas no acidente com o avião da TAM em Congonhas, e qual foi a reação? Enquanto o presidente se recuperava de uma cirurgia plástica, assessores faziam gestos obscenos quando descobriram indícios de que o governo estaria isento de culpa e dias depois, ao nomear o novo ministro da defesa, o presidente fez piada sobre os motivos da chamada do ministro. Diz ele que chamou o novo ministro porque sua esposa não o agüentava mais em casa. Aí eu é quem pergunto, quem vai chamar o Lula para dar uma folga para a Dona Marisa? Por que convenhamos, não deve ser fácil agüentar piadas idiotas e opiniões amadoras sobre futebol o dia todo. Será que o presidente não tem ninguém com um mínimo de noção no seu gabinete, que o alerte sobre a pertinência de seus comentários? Ou será que teimosia é mais um de seus atributos, e ele não os escuta?

Honestamente, se eu e meus colegas tivéssemos tido metade do deboche do presidente ao tomar as medidas inevitáveis que tomamos, estaríamos engrossando as estatísticas do desemprego, pois não é isto que se espera de profissionais sérios. Infelizmente os cidadãos brasileiros, patrões do presidente, estão dormindo, e ele não vai ter o destino que merece, o olho da rua.