domingo, 27 de julho de 2008

Duas Maneiras

Meu irmão me mandou uma mensagem encomendando um texto sobre a relação entre crise e oportunidade. Não deve ter assunto mais batido em textos sobre gestão, e ele sabe disso, mas como recusar o pedido de um irmão? Acho que ele está me testando, costume que carrega desde pequeno, e que eu adoro, pois sempre me faz refletir e crescer um pouquinho mais. Só não contem isso para ele.

Todos sabem que transformar crise em oportunidade é uma questão de postura frente aos problemas. O que importa é tentar sempre ver as coisas de uma maneira positiva, o que nem sempre é fácil. Tem gente tão negativa que não só não transforma crises em oportunidades, como acaba fazendo o contrário. “, tem um cliente novo chegando, quer que a empresa praticamente dobre a produção, já pensou a dor de cabeça? Onde vamos parar desse jeito? Vou ter que falar com o chefe.” Existem pessoas como essa aos montes por aí.

Conhecemos incontáveis exemplos de gente que perdeu o emprego e iniciou negócios de sucesso, de empresas que perderam seu mercado e mudaram de rumo tornando-se ainda maiores e mais lucrativas e assim por diante. Por isso, ao invés de explorar estes exemplos, vou partir para uma análise mais simples e mais proativa, de como antecipar as crises e agir antes mesmo que elas cheguem.

Já faz algum tempo eu era coordenador de uma das áreas de engenharia de uma fábrica de motores. Minha equipe era enorme e eu trabalhava duro para dar conta dos dois engenheiros que a compunham. Certo dia um deles entrou na nossa sala soltando fumaça pelo nariz, indignado com o pessoal da manutenção. Era a milésima vez que eles o chamavam para recuperar o programa de aparafusamento de uma das máquinas da linha de montagem. A responsabilidade não era dele e àquela altura eles já deveriam saber fazê-lo. Após fazer algumas perguntas para ele sobre a situação, minha resposta foi, “vá lá e faça o que eles estão pedindo”. A fumaça que saia do nariz se transformou em labareda e ele me disse que não iria fazer. “Desta vez não. Eles têm que aprender de uma vez por todas”. Nesse momento tive que apelar para a hierarquia e disse para ele ir e que aquilo não era um pedido. A labareda do nariz começou também a sair pelas orelhas. Para não perder o emprego ele foi e resolveu o problema. Será? Mas o que poderia ele ter feito para que o problema não voltasse a ocorrer?

Quando ele voltou para a sala, esperei que se acalmasse e o chamei para uma conversa. Na verdade para uma sessão de perguntas:

- Por que você ficou tão nervoso em ajudar a manutenção?

- Você sabe o porquê. Toda vez é a mesma história. Esses caras não vão aprender nunca.

- Aprender o que?

- , a programar as aparafusadeiras.

- E por que eles têm que aprender a programá-las?

- Porque é tarefa deles fazê-lo e assim não teriam que me chamar toda vez.

- E por que eles te chamam toda vez? – o engenheiro que já tinha se acalmado, começa a ficar irritado novamente com todas as perguntas.

- Porque só eu sei programar as aparafusadeiras!

- Nesse caso, como você acha que eles deveriam aprender a programá-las?

Toda a inteligência do engenheiro, capaz de resolver os problemas mais complexos, ainda não tinha o ajudado a se livrar do sentimento de indignação para enxergar a coisa mais simples de todas. Se, ao invés de perder seu tempo cuidando das emergências, ele o investisse em ações preventivas, o problema já teria sido resolvido há muito tempo. Era obviamente dele o papel de reunir toda a equipe da manutenção para um treinamento detalhado e extensivo sobre como programar as aparafusadeiras.

Geralmente quando estamos muito envolvidos em um problema, nossa tendência é enxergar maneiras de resolver a emergência e não de evitar que ela ocorra novamente. A figura abaixo mostra o confronto entre os paradigmas de urgência e importância.





Existe uma confusão enorme entre aquilo que é importante e aquilo que é urgente. A confusão é tamanha, que acreditamos muitas vezes que o que é urgente é automaticamente importante, o que não e necessariamente verdade. Vamos voltar ao caso do engenheiro. Arrumar a aparafusadeira era igualmente urgente e importante. Urgente, pois tenha que ser resolvido naquele momento. Importante porque uma linha de produção parada afeta diretamente os resultados da empresa. Através das perguntas, o que estava tentando fazer era exatamente tirá-lo do quadrante I e levá-lo para o II. Se conseguirmos investir nosso tempo em ações importantes, mas planejadas com calma, sem urgência, podemos aumentar as chances de que as urgências não ocorram. No nosso exemplo, se o engenheiro investisse seu tempo treinando o pessoal da manutenção, o que claramente é uma atividade muito importante, mas sem urgência alguma, evitaria no médio prazo ser chamado para resolver outros problemas parecidos. Mas como conseguir tempo no quadrante II se passo minha vida no quadrante I?

Essa é geralmente a pergunta que me fazem quando falo dos quadrantes. A resposta é simples, elimine atividades dos quadrantes III e IV, que são as sem importância. Atividades do quadrante IV são fáceis de eliminar, pois geralmente são atividades de ócio, muitas vezes importantes para a manutenção da sanidade mental, mas algumas vezes exageradas. A armadilha está no quadrante III. Como são urgentes, fantasiam-se de importantes e tornam-se difíceis de eliminar. O maior exemplo que consigo pensar são algumas reuniões convocadas para resolver um problema urgente que não é seu, ou com o qual você pode contribuir pouco.

Quando temos a coragem de dizer não para as atividades dos quadrantes III e IV, e temos a lucidez de investir o tempo que sobrará no quadrante II, ao invés de deixar o tempo ser consumido pelo quadrante I, evitamos cada vez mais as “urgências importantes” do quadrante I, entrando em um ciclo virtuoso de desempenho.

Agora você deve estar se perguntando, e o que esta história de quadrantes tem a ver com aproveitar as crises e transformá-las em oportunidades? Alguns mais negativistas até diriam, você não está conseguindo entregar o que teu irmão encomendou. Calma! Com um exemplo simples fecho a relação.

Uma jovem profissional que eu conheço participou de um processo de seleção para uma empresa local que faz implementação e desenvolvimento para um dos grandes sistemas de ERP mundial. Quando recebeu a notícia de que não seria contratada, poderia ter encarado o quadrante I. Afinal, qual maior “urgência importante” do que estar sem emprego? Ao invés disso, ela aproveitou a crise do quadrante I para transformá-la em oportunidade. Eliminou todas as atividades sem importância dos quadrantes III e IV, e investiu o tempo que sobrou no quadrante II. Foi atrás das pessoas que tomaram a decisão de não escolhê-la e quis saber os motivos. Com estes em mãos, ao invés de partir para a procura de outro emprego, partiu para resolver os gaps apontados. Um deles era um treinamento que deveria ser feito em outra cidade. Largou tudo e foi. Antes mesmo que o treinamento acabasse, a própria empresa que a havia recusado chamou-a para trabalhar com eles.

A crise está no quadrante I, a oportunidade é criada no quadrante II, ambos de igual importância. O que muda é a atitude.

Enquanto preparava este texto, fui trocando algumas idéias com meu irmão. Ele diz que não fez a encomenda para me testar, como eu havia dito no primeiro parágrafo. Eu acredito nele, mas ficou mais divertido acreditar que era este o caso.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

O que é resultado?

Sala de reuniões principal, chefão sentado na sua cadeira habitual, bem no centro da mesa, cercado de seus gerentes. Do outro lado da mesa, um visitante importante pergunta sobre os avanços dos últimos meses. O primeiro gerente começa:

- Devido aos problemas de qualidade, começamos a fazer um acompanhamento semanal. Nos reunimos a cada segunda-feira para revisar o plano de ação, onde revisamos cada item com cada responsável.

- A mesma coisa com a produção – emendou o segundo. - Perdemos muito tempo com uma das máquinas e a cada hora fazemos uma revisão dos números, com o responsável de cada unidade de trabalho. Temos também um plano de melhoria para cada causa de parada.

Todos usavam com muita ênfase, e muitas vezes, a palavra cada. Um sinal de controle.

- Agora, cada usuário tem o seu próprio notebook, com acesso remoto sem fio e conexão com cada sistema da empresa – falou o de informática.

O chefão olhava orgulhoso para seus gerentes. O visitante importante sorria satisfeito. O tour de table continua com o de compras:

- Temos um acordo com cada fornecedor para discutir a cada mês um plano para melhorar a confiabilidade de cada entrega.

E assim foi, um por um até chegar ao último, que tinha conseguido reduzir 1000 reais por mês com uma otimização simples dos transportes de peças do qual era responsável. Morreu de vergonha na hora de mostrar seus números, tímidos para uma empresa que fatura centenas de milhões, mas que se for ver bem, mostravam o único resultado de verdade do grupo. Os colegas, cada um deles, olharam com desprezo para ele, pois não tinha um plano de ação, nem um acompanhamento semanal, muito menos acordos com ninguém, apenas resultados. Onde já se viu.