domingo, 18 de maio de 2008

O sistema Toyota e os processos empresariais

Há muito tempo as grandes empresas buscam reproduzir nos seus modelos de gestão, o famoso modelo desenvolvido e aplicado pela Toyota, conhecido no ocidente como Sistema Toyota de Produção (Toyota Production System – TPS). Algumas com mais sucesso que outras, o fato é que ninguém ainda conseguiu chegar sequer perto do que os japoneses têm conseguido nos últimos anos. A recente conquista do primeiro lugar em vendas de veículos pela Toyota deve engordar ainda mais as fileiras de livros que tentam lançar um novo, mais aprofundado, ou mais fiel olhar ocidentalizado sobre o TPS. Temos nossas dúvidas se os novos livros que virão serão capazes de evitar a confusão que normalmente se faz na interpretação dos elementos mais básicos do sistema.

Para melhor explorar esta tese, vamos utilizar um dos conceitos mais difundidos e aplicados do sistema Toyota, a relação cliente-fornecedor, e traçar um paralelo entre este conceito e um outro de gestão focada no cliente, o de gestão por processos.

A figura 1 ilustra a relação cliente-fornecedor. A interpretação mais comum desta figura é de que o cliente externo é atendido pelo operador, que é atendido pelo líder de time, pelo líder de grupo e assim por diante. A espinha dorsal deste modelo está centrada em uma área específica, neste caso, a área de produção. Todas as outras passam a ser áreas de suporte à produção.


Figura 1 – Relação cliente-fornecedor no Sistema Toyota de Produção (clique na figura para ve-la melhor)

Nada contra este conceito, mas se pararmos para analisar com mais profundidade, ele pode induzir a um erro de interpretação gravíssimo do ponto de vista de atendimento ao cliente.

Antes de continuar, vamos introduzir o conceito de gestão por processos. Nele, uma empresa é gerida através de processos, que são desenhados de maneira a agregar recursos de diversas áreas de uma empresa, para a construção de uma cadeia lógica de atividades que agregam valor ao produto, seja ele um serviço, uma informação, um equipamento ou um material, de modo a atender às necessidades do cliente final. A figura 2 mostra uma estrutura matricial, onde as áreas funcionais têm intersecções com os principais processos de uma empresa.

Analisando a figura, percebemos que o que agrega valor ao cliente são os processos empresariais, e não as áreas. A área pode estar cheia de funções necessárias, mas pelas quais o cliente não está interessado. Os processos críticos, por outro lado, deveriam ser compostos apenas de atividades que agregam valor ao cliente, e que ele perceba este valor.


Figura 2 – Estrutura matricial na gestão por processos (clique na figura para ve-la melhor)


Assim, o erro de interpretação geralmente cometido quando se analisa a relação cliente-fornecedor no TPS, é considerar que a espinha dorsal desta relação seja uma área específica, e não um conjunto de pessoas que executam atividades que agregam valor ao cliente, na forma de um processo bem estruturado. Se juntarmos as duas figuras, percebemos com mais clareza o ponto que queremos defender.

Na figura 3 colocamos a espinha dorsal do modelo cliente-fornecedor alinhada com as áreas da empresa (interpretação mais corriqueira). Podemos perceber que os clientes neste caso são os gerentes ou líderes das áreas. Mas espera um pouco, é isto o que se espera de uma empresa? Achamos que não.


Figura 3 – Relação cliente-fornecedor com o foco nas áreas funcionais (clique na figura para ve-la melhor)


De outra forma, se alinharmos a espinha dorsal da relação cliente-fornecedor com os processos de agregação de valor, o cliente externo é o verdadeiro beneficiário do modelo utilizado pela Toyota. A figura 4 ilustra esta situação.


Figura 4 – Relação cliente-fornecedor com o foco nos processos (clique na figura para ve-la melhor)


Não é de acreditar que a Toyota aplique o modelo da figura 3. Pelo menos não é o que parece quando analisamos os números recentes atingidos pela empresa. Assim, quando dizemos que o operador é a figura mais importante do modelo Toyota, podemos concluir que a figura do operador pode ser representada por um analista, um engenheiro, um designer, ou qualquer outro profissional que faça parte de um processo que esteja alinhado com as estratégias da organização e, por consequencia, com as necessidades do cliente. Aí sim a relação cliente-fornecedor se torna merecedora deste nome.

sábado, 17 de maio de 2008

Para que imitar os iguais?

Difícil encontrar algum gestor, consultor ou palestrante que ignore o poder do benchmarking. A ténica, que consiste na busca das melhores práticas do mercado (benchmarks), para posterior análise e adaptação das práticas da própria empresa, pode ser utilizada de várias maneiras, mas com alguns cuidados pode trazer mais benefícios do que se imagina.

Existem vários tipos de benchmarking, a saber, de processos, financeiro, de performance, de produto, estratégico e funcional. Vamos nos deter ao de processos. Este tipo debenchmarking é um dos mais complicados de se realizar por vários motivos. Um deles é garantir que se diferencie processo, ou como as atividades são organizadas para se garantir um produto final ao cliente, de perímetro, qual seja o produto criado e os clientes que esta sequência de atividades atende. Deve-se garantir, em uma comparação das empresas analisadas com a sua, que esta seja feita iso-perímetro, mas nunca iso-processo. Explico com um exemplo, estava preparando um benchmarking para uma revisão de processos que envolverá várias áreas da empresa onde trabalho. No painel de empresas levantado, uma delas se destacou muito das outras no indicador que escolhemos para o estudo. Desconfiado do resultado, telefonei para o responsável para ver se estávamos falando do mesmo produto e dos mesmos clientes. Para minha surpresa, clientes e produtos eram os mesmos, o que era radicalmente diferente era o processo utilizado para criar o produto e atender às demandas dos clientes. Quando apresentei o estudo, a primeira afirmação que veio foi, "Mas o processo deles é completamente diferente do nosso, não dá para comparar." Como não dá para comparar? Se o processo deles fosse idêntico ao nosso, os resultados também seriam idênticos. Eles só fazem melhor porque acharam uma maneira melhor de entregar o mesmo produto aos mesmos clientes. Não é justamente esta a função do benchmarking?

Por este motivo é que acredito que se deve ser muito cauteloso com a utilização dos benchmarkings internos. Se você faz o benchmarking em outra unidade de uma empresa que tem, por exemplo, o terceiro ou quarto lugar de participação no seu mercado, mesmo que aquela unidade tenha resultados muito melhores do que a sua, fica claro que a referência que se está buscando não é das melhores. Por que não ir para fora? Esta é outra grande armadilha do benchmarking de processos, buscar a referência dentro de casa, sem abrir os olhos para o mundo. É muito provável que dentro de casa você só encontre quem faça o mesmo processo de maneira melhor, e não o melhor processo.

Com o cuidado de olhar para os lugares certos e evitar buscar processos que sejam iguais aos seus, o poder do benchmarking se multiplica e você corre o grande risco de virar a referência. O tipo de risco que vale a pena.